segunda-feira, 28 de março de 2011

Despido de ti

Chua, chua, chua. Não! Chuaaaaaaaa....
Isso! Leia como um único movimento!
Aí você dá um passo, estende a mão e roda aquele lugar por onde deixa cair à água do chuveiro.
Nesse instante, você dá mais um passo e se entrega nu dos pés a cabeça a aquele cobertor quente, feito por retalhos de gotas que descem a sua pele e envolve teu corpo como se de ali em diante fosse tudo o que a tua alma e corpo estivessem pedindo para serem complementadas.
Nisso, fecha-te os olhos com força, como se por aquelas gotas fosse descer a tristeza do dia, descer a decepção da vida, descer as máscaras, descer a raiva, descer teu descaso, descer a sujeira e a poeira do andar incrustado no couro, descer, descer, descer e vai embora; pelo ralo.
É nesse cubo de espaço em que só sobramos nós mesmos. Despidos, abertos, sentindo-nos respirar, pensar, sonhar, gritar, chorar, ouvir o pulsar do coração e o movimento das ideias.
Então, minhas mãos desceram pelo corpo e conheceram o meu umbigo. É daí que a ideia provida pelo tempo concedido a mim, surgiu.
Vim do outro, dos outros e cortaram o que era um, para ser dois, eis que surgiu o meu eu, meu ego, meu auto, meu mono, minha vida, minha existentia.
E o que é existir? Para que existir?
Não digo isso para rever o assunto, para reforçar o clichê, mas porque como Picasso disse “quando encontrava algo para expressar, eu o fazia sem pensar no passado ou no futuro”.
Acho que é isso... Nós vivemos para esse universo conhecido, nascemos e agora vivemos, e o mais misterioso e fascinante nisso tudo é... Chamamos de vida! Que palavra curta e intensa.
Mas não é por ser a minha vida, mas o que dela faço por outras pessoas, os outros eus, os outros egos, as outras existentias.
É incrível pensar no outro ser e em como ele pode Ser, em como ele vive, pensa e sente.
          Se você aí, desse lado que está me lendo, está me entendendo é porque temos algo em comum; todos temos. Mas não digamos que somos iguais, pois nossas diferenças são como a cereja na ponta da existência.
Agora, é estranho pensar em como cada pessoa ou coisa qualquer que passa ao nosso redor, nós podemos aprender algo com o mesmo.
Mas aí você acorda e não olha e admira o Sol e o Céu, anda e não vê a terra na poeira, no contato da superfície dos sapatos com os pés, passa de cabeça erguida e não conversa com o mendigo, com o vendedor de brincos, com o moço jovem que estava na loja ou não conversa como pessoa com o seu professor, com o seu chefe, com o empregado, com o frentista que abasteceu o seu carro, com o seu filho, com seus pais. Do mais longe ao mais próximo, elas não estão precisamente longe do passo de cada dia, longe de tal cotidiano.
Bem, até podem estar. Porque não? Porque não ter algumas criatura inventadas e idealizadas que só existem dentro de nossas cabeças? Se elas levam algo que acrescenta em nosso eu, é válido. Mas não esqueça jamais: hão de existir muitos na aparência mais singela, real e próxima de ti.
Tiremos as máscaras que encenam papéis sociais e vejamos pessoas, conversemos com elas; para nos tornarmos mais humanos, ali há estórias, bons conselhos, uma visão de mundo, um ângulo oposto, algo em comum e algo de diferente, esse é o mistério de ser.
E sobre ser... Ah, somos todos filhos, pelo fato de sermos crianças que tão pouco compreendem a bela teoria e ficam cambaleando entre a vida, entre os acertos e os erros.
Isso! Uma Vida.
Eternas crianças... Em busca do crescimento. Crescimento do que?
Não sei. Hum... Procuremos o nosso.
Olhe ali! Olhe do lado! Olhe do outro lado!
Agora para dentro!
Esse é você! Senhor humano!
O que tu és? Não sabes?
Então de um passo... E chuaaaaaaa! Abaixe a cabeça na água do barulho e se entregue despido de ti.