sábado, 9 de junho de 2012

A princesa e os príncipes


“Esta história será feita de palavras que se agrupam em
frases e destas se evola um sentido secreto que
ultrapassa palavras e frases.”
(Clarice Lispector)

– Está tudo bem, minha linda! Agora descanse um pouquinho! A cirurgia foi um sucesso e a mamãe não sairá do seu lado! Marina – deitada num leito – olha pela janela e vê o azul do céu muito brilhante sorrindo. Não haviam mais aparelhos ou sondas como os fragmentos da sua memória mostravam. Não era sonho – dada a realidade –, mas poderia ser – dada a sensação. Era uma menina, uma linda menina. Havia acabado de passar por uma complicada cirurgia. Usava um vestido deslumbrante em tons degradês de um verde esperança que quando era tocado pelo vento assemelhava-se ao movimento das ondas do mar. Os seus olhos brilhavam e agradeciam o amor de sua família. Naquele momento ela pensava em como a dor foi capaz de lhe mostrar a importância do amor e da união daqueles que se amam. Quando eu crescer quero ser corajosa igual à mamãe. Sua voz – ainda rouca – chamou pelo pai e pelos dois irmãos. Queria ver todos os lábios ao seu redor sorrindo, todos vibrando por sua vitória. Dona Maria já não era capaz de distinguir se era noite ou dia, havia passado a semana toda dentro daquele hospital ao lado do seu tesouro mais precioso, sua filha. Mas dona Maria nunca se esquecera daquela frase cuja última palavra tem o seu nome, e depois da tempestade veio a calmaria, calma-maria.
Do outro lado da cidade, seu José e os dois filhos – Mário e Murilo – sobem no ônibus que levará os três até o hospital que Marina habitou por tanto tempo. Hoje é dia de alegria. – Papai! Estamos chegando? Estou com tanta saudade da Mari! O pai daquela família batalhadora fixa os olhos no movimento da gota de chuva que vai caindo no vidro e passa o percurso todo imaginando como estará sua esposa e sua filha. Faltam apenas três dias para Marina voltar para nossa casinha.
– Papai, papai! Fala comigo! Estamos chegando?.
– Fiquem quietinhos! Daqui a pouco chegaremos e vocês poderão ver a nossa princesinha. Mas, por favor, não façam bagunça no hospital. Lá é um lugar onde o silêncio deve reinar.
– Ué, como assim papai? Tem um rei no hospital? E a Mari virou princesa? O que se reina?
Só aquelas crianças eram capazes de fazer o seu José sorrir naquele momento. A ansiedade e a emoção eram nítidas em seus olhos que confundiam com o brilho da gota de chuva, a chuva que fechava o verão e caia sobre os olhos daquele pai.
– Ah, meu Deus! Não, meus filhos! Não tem rei nem reino. Quando o papai falou “reinar”, eu quis dizer que deve predominar o silêncio, que no hospital não pode fazer barulho, entenderam? Agora, quanto a Mari ser uma princesa isso ela é, pelo menos pro papai.
– Mas se a Mari é princesa, eu e o Mário somos príncipes?
– Eu quero ser príncipe, papai!
– Então os príncipes estão prontos pra descerem da carruagem e visitarem a princesa no castelo silencioso?
         Em coral, os meninos respondem sorrindo: – Sim, vossa majestade!
O pai e os filhos com passos rápidos chegam até a recepção do hospital, digo, do castelo. Seu José segura nas mãos dos meninos que permanecem quietinhos, mas trocando olhares cheios de ideias. Já tinham pensado até na coroa que seria feita com os jornais guardados no armário que ficava no quintal de casa. Então, seu José, o majestoso rei, chega ao quarto 310, respira fundo e abre a porta. Mário e Murilo correm pra cama de Marina.
– Mari, Mari! O papai falou que você agora é princesa e eu e o Mário somos príncipes.
O rei dá um beijo na testa da princesa de vestido verde e depois de algumas palavras carinhosas deixa a princesa conversar com os príncipes do castelo. – Só não esqueçam da ordem do rei: No castelo deve-se falar baixinho e nós só temos uma horinha com a princesa. Nada de bagunça!
Dona Maria e seu José sentam-se num sofá e observam as crianças. Ela chora tentando esconder as lágrimas, é um choro que alivia. Seu José lhe diz palavras bonitas e demonstra todo o orgulho que sente da esposa com um abraço muito apertado e com o seu ombro amigo que conforta e lhe dá forças pra seguirem em frente nesse momento novo de suas vidas. Em breve Marina chegará em casa e a estrela de cinco pontas que é aquela bela família brilhará ainda mais forte. Os minutos correm enquanto o casal conversa, se emociona e relembra os momentos mais difíceis do tratamento de Marina. – Meu bem, você se lembra como foi difícil conseguir vaga num bom hospital? E como era difícil conseguir alguém pra ficar com os meninos? – Amor, foi realmente uma fase difícil, mas agora vamos nos acalmar e procurar aprender com tudo o que passamos durante esse período. Veja os nossos meninos! São outras preciosidades que sentem sua falta e precisam de atenção também. Ontem mesmo Murilo veio me perguntar porque a mamãe não dormia mais em casa há dias, se ela tinha esquecido do seus pestinhas...
A enfermeira entra dizendo: – um grande poeta já disse: “o passado é lição para se meditar, não para se reproduzir”. Os pais de Marina se entreolharam e com uma longa piscada de olhos mostraram a Angélica que tinham compreendido o que ela havia dito. – Meninos! Agora a Mari tem que dormir e ficar bem descansadinha... Se preparar para voltar pra casa.
– Moça, nós não somos meninos comuns. Somos príncipes e a Mari é princesa. Você sabia?
– Ah, é?! Eu não sabia. Mas então vamos deixar essa princesinha tirar um sono de beleza pra voltar pro castelo?
O momento da despedida se aproximava. Dona Maria não conseguia soltar as mãos de seu José. Seu coração sangrava, seus olhos enchiam de lágrimas, sua boca proferia palavras de agradecimento, amor e orgulho pela bela família. Os filhos estavam tão alegres por terem conseguido ver Marina. Murilo chegou a prometer que quando a princesa estivesse chegando de volta ao castelo haveria uma grande festa. Mário implorava por mais cinco minutinhos ao lado da irmã. A mãe mostrando a enorme felicidade por tê-los com ela, dizia que Murilo estava certo. A rainha olha para o rei, os príncipes e a princesa dizendo: – o príncipe Murilo tem toda razão. Daremos uma festa em nosso castelo assim que nossa princesa voltar. Peço aos meus príncipes que ajudem o rei a preparar o castelo nesses poucos dias que temos para o grande evento.
Nos dias que se seguiram dona Maria e Marina passaram no hospital aguardando a liberação dos médicos. Seu José acordava cedo pra fazer o café, chamava os meninos, os levava na escola e seguia para o trabalho. No longo caminho que tinha pela frente pensava na frase de Angélica. Um filme passava em sua cabeça. Aos 13 anos já trabalhava ajudando o seu pai. Só conseguiu frequentar a escola por quatro anos. Casou-se com 17 e foi pai aos 18. Anos depois já tinha seus três filhos lindos. Quando Marina fez 12 anos descobriram que ela estava muito doente e necessitava de grande atenção. Neste período o seu mundo caiu. Sua esposa era um anjo. O amor daquele casal foi capaz de resistir à fome, à dor e ao sofrimento. Agora era hora de recomeçar... Não viveria mais do passado, já havia aprendido muito com ele.
Sábado ensolarado. Céu azul e arco-íris lá longe. Bandeirinhas de papel colocadas no varal de dona Maria. Murilo e Mário traziam nas mãos vasinhos de flores. A kombi buzina. O coração dos três salta para a boca. As duas majestosas mulheres – a rainha e a princesa – descem e vão de encontro aos demais importantes membros daquele humilde castelo. A sensação de felicidade é indescritível.
– Mari! Pegue a sua coroa! Fizemos pra você, princesa!
– Vocês são ótimos irmãos, sabia?
– Ah, Mari! O papai disse que você nos deu uma grande lição. Ele falou que devemos ser sempre bondosos e pensar no próximo.
– Mário! O papai também disse que agora nós vamos começar uma nova fase, que não devemos viver com olhos no passado, mas nunca esquecer tudo aquilo que ele nos ensinou.
Os dias que vieram não foram dos mais fáceis. Afinal, o famoso “felizes para sempre” aparece apenas nos contos de fada. Dona Maria cuida do castelo, do rei, da princesa e dospríncipes. O seu José continua trabalhando muito para dar conforto às crianças. E essas, tornam-se a cada dia seres humanos mais sensíveis e admiráveis porque aprenderam que “as pessoas mais felizes não têm as melhores coisas, elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos” (LISPECTOR, 1993: 21). 

Thaysa  Audujas

quinta-feira, 22 de março de 2012

O Poema [e o Tempo]


O poema me levará no tempo
Quando eu já não for eu
E passarei sozinha
Entre as mãos de quem lê

O poema alguém o dirá
Às searas

Sua passagem se confundirá
Como rumor do mar com o passar do vento

O poema habitará
O espaço mais concreto e mais atento

No ar claro nas tardes transparentes
Suas sílabas redondas

(Ó antigas ó longas
Eternas tardes lisas)

Mesmo que eu morra o poema encontrará
Uma praia onde quebrar as suas ondas

E entre quatro paredes densas
De funda e devorada solidão
Alguém seu próprio ser confundirá
Com o poema no tempo

(Sophia de Mello Breyner Andresen)

segunda-feira, 5 de março de 2012

Um olhar (também) pode mover o mundo!


"O correr da vida embrulha tudo,
a vida é assim: esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa, sossega e
depois desinquieta. O que ela
quer da gente é coragem."
(Guimarães Rosa)

Não direi que falta coragem pra escrever, falta mesmo é tempo e palavras em mente pra expressar os sentimentos! Mas pra tudo dá-se um jeito, e confesso que se fosse contar tudo o que vivemos nessas últimas semanas, ia escrever muito. Resolvo fazer um post contando aquilo que de mais nítido está em minha memória e em meu coração :)

Comecemos pelo meu aniversário! 30 de dezembro! É sempre uma alegria estar junto aos meus verdadeiros amigos no litoral. Todos os anos, nos reunimos e além da comemoração, é o dia de contar as novidades, compartilhar as angústias e ideias que vislumbram o ano que virá! No dia seguinte, reuni-se a família, pula-se as 7 ondas, fazemos os pedidos, mais alegria contagia nossos corações!

O ano novo chega! Só que dessa vez, algo diferente e muito bom acontece. Falta exatamente uma semana para eu e a minha queridíssima prima Júlia irmos para a África do Sul. Uma viagem inesquecível...

Foi uma experiência incrível. Não só por ter a oportunidade de conhecer uma cultura e um povo diferente (o que já foi maravilhoso!), mas pela convivência em grupo, e, principalmente, a convivência com a Júlia. Uma menina surpreendente! Ao mesmo tempo que eu me sentia responsável por ela, sentia sua super proteção em relação a mim, mesmo que de uma maneira mais contida (talvez eu seja sentimental demais!)rs.

Minha relação com a Júlia, minha prima-irmã-melhor amiga, lembra-me alguns versos do Carlos Drummond de Andrade que dizem: "Amor é dado de graça,/ é semeado no vento, / na cachoeira, no eclipse. / Amor foge a dicionários / e a regulamentos vários." Eu a amo de uma maneira que não seria capaz de descrever, nunca! Nos dias que vivemos juntas por lá, eu tinha ela, e ela tinha a mim. E nos momentos que batia a saudade, a insegurança, a ansiedade, era ela que me confortava e me ajudava a encontrar a plenitude novamente. Na verdade acho que eu ainda não sou capaz de perceber que a Júlia vem crescendo, pois, aos meus olhos, ela será sempre a minha priminha :)

Vivemos momentos de diversão, de medo, de ansiedade... E como nunca se distingue o bem vivido do não vivido, vivemos! E quando percebemos os dias passarem, observamos melhor o mundo, as pessoas, os sentimentos... As coisas mostram um valor diferente. Aprendemos a dar o valor que realmente todas essas coisas tem!

Bom, eu poderia ficar aqui descrevendo vários passeios que fizemos, vários pensamentos que nortearam as nossas cabeças durante todos esses dias, mas o essencial é invisível aos olhos, visível ao coração! Além da experiência sem tamanho que passamos, sinto que crescemos como seres humanos que somos. Imagina a sensação de estar num lugar repleto de crianças que te olham com um brilho no olhar que só você foi capaz de ver e sentir...decifrar a mensagem de carinho que elas transmitiam mesmo sem proferir uma palavra! São coisas impagáveis que a vida nos proporciona.

As conversas que nós tivemos antes de dormir, ou mesmo no final das aulas, foram todas construtivas e humanizadoras. Sinto muito orgulho de poder viver, conviver e crescer ao lado de pessoas tão especiais assim! Esse primeiro post do ano é dedicado a Júlia! Alguém que se reinventa a cada momento e é capaz de nos dar lições de vida com o seu jeito singelo de ser!




quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Rumo ao 3º ano!

Talvez essa seja minha última publicação do ano. Chego agora na metade do curso de Letras... Esse semestre foi a minha “prova dos nove!”... Sorte que tudo deu certo e, assim, rumo ao 3º ano! Foi um semestre de boas experiências, alguns desesperos, inseguranças, alegrias... Na verdade acho que os seres humanos estão sempre de prontidão, à espera de algo, de uma novidade. Buscando preencher o vazio que é necessário. Talvez o “vazio” nos ensine a sermos mais “humanos”, nos permita sentir novas emoções, nos torne mais sensíveis. Hoje senti vontade de escrever... Mas não sei dizer sobre o quê. Minha vida é repleta de sonhos, aspirações, e vazios que eu vou tentando preencher... Repleta também de perguntas sem respostas que me fazem pensar que vale mais “viver um dia de cada vez”, e esperar a hora certa de obter respostas aos tantos porquês. Particularmente, prefiro acreditar em recomeços...

Bem, um novo ano começa, ou recomeça... Quantas coisas acontecerão no próximo ano? Vivamos pra saber! Surge uma inquietude... Talvez seja necessário fazer planos? Será que não conseguimos “viver um dia de cada vez”? Será que as pessoas estão se contradizendo a todo instante? Acho que as pessoas não possuem a necessidade de saber quanto tempo vão durar, mas do que se esperar do tempo que virá. Mas então, podemos esperar? O mundo de nada sabe das questões individuais... Mas nós, humanos, nós sabemos!

PS: Acabo de notar que esse título serve pra mim e pra Júlia! Mais uma vez, primas em sintonia!rs

sábado, 12 de novembro de 2011

Tem alguma coisa que você queria para o mundo?

Oh, galerinha... Parabéns a todos que acreditam em um clichê ou uma frase que essa mídia manipuladora apresenta! Vocês são realmente "sensatos", normais, mais um.

Os muitos manifestantes da USP que estão querendo o fora Rodas e o fora a PM não querem isso pra "fumar maconha".  Ou vocês acham mesmo que quase toda a FFLCH e, agora, a ECA iam se juntar por essa causa? Será mesmo? Como bons brasileiros temos memória curta, neh? Pois esse movimento do fora a PM já tinha acontecido desde 2009 e no começo do ano teve novamente. Ocorreu um caso que nenhuma mídia divulgou, que no começo desse ano um menino de 10 ou 13 anos (não lembro direito) da favela  perto do campus da USP estava tentando pular a grade da piscina do centro esportivo, quando o carro da PM passou e atirou nele, o menino morreu. Sem direitos. Como alguém que nunca existiu. Junto com esse fato houve repressão nos atos da Tarifa e outros que os estudantes organizaram. Então, voltou o "fora a PM". Além de que o reitor, Rodas, ficou na eleição em 2° lugar e o governador mesmo assim, colocou-o no cargo. E a sua gestão já mostrou que ele não tem o menor senso de diálogo com os que ele deveria se preocupar, os estudantes; ou a tal democrácia (como o Alckmin diz). To achando que o único diálogo que ele tem é com os tucaninhos na floresta da direita.

E poxa, os estudantes não são cegos também de não saberem que há a necessidade de melhorar a segurança no Campus. Ai se tomou por exemplo o caso do garoto de economia que foi morto no estacionamento... Ah, a PM já ocupava o campus aquela época, ok? Aqui mesmo fala: "MAS E A DIMINUIÇÃO DE 60% NA CRIMINALIDADE APÓS O CONVÊNIO USP-PM? São dados corretos. Porém a estatística mostra que esta variação não está fora da variação anual na taxa de ocorrências dentro do campus ( http://bit.ly/sXlp0U ). A PM, portanto, não causou diminuição real da criminalidade na USP antes ou depois do convênio. Lembre-se: ela já estava presente no início do ano, quando a criminalidade disparou." ( http://www.facebook.com/note.php?saved&&note_id=315711538455058#!/notes/jannerson-xavier/esclarecendo-o-caso-usp-pra-quem-v%C3%AA-de-fora/2459499642739 )

Os estudantes querem a PM fora porque uma universidade precisa de liberdade para promover seus pensamentos, suas inquietações e manifestações, afinal se isso não partir dos jovens vai vir de quem? Pois universidade é, sim, para estudar, mas é a fase que você tem para abrir a cabeça, descobrir e testar o mundo e fazer algo melhor para ele. Universidade não tem que ser só um lugar para estudar.

E se acha que manifestação é "coisa de vagabundo" devia achar isso quando os políticos roubam e colocam leis que só melhoram a bunda deles e ninguém fala nada. Por quê? Ah, porque não dá tempo de você reivindicar isso ou aquilo, o que acha de errado? Mas pra falar mal de quem tá fazendo a sua reivindicação, você consegue, não é? Uma sociedade sem espaço para revidar em paz, é uma sociedade morta. Ainda não chegamos nesse ponto, porque mesmo quando os jovens da USP e de todas as outras universidades públicas e privadas são reprimidos, ainda assim, continuam lutando e fazendo valer a vida que têm. A Vida num sentido maior, de fazer diferença.

Mas voltando, se a Rede Globo, Veja, Estadão, SBT, entre outras destas mídia manipuladoras que se mostram a favor do PMDB, Geraldo Alckmin e Rodas, essas ai que você não precisa correr atrás, é só abrir o olho e engolir, se essas fontes de informação que usa com a maior parcialidade sobre o assunto, então vamos lá... Os estudantes querem o fora do Campus, mas também criticando o que o que eles fazem fora, quando sobem morros e matam ou batem injustamente (vá saber o que é justo também...), a própria corrupção que há nela, as abordagens que fazem nas ruas com qualquer um que se mostre “estranho” e até quando batem ou atiram de graça etc. Porém numa universidade eles não querem uma polícia que porta arma de fogo ou uma polícia fruto da repressão que porta estrelas no peito que significam atos realmente “dignos de Honra” (olhem - http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/gilberto-maringoni-brasao-da-pm-paulista-e-um-tapa-na-cara-do-povo-brasileiro.html ) e que não seguem a lei também na hora da ação. Pois é ilegal tirarem as identificações como fizeram nas manifestações (isso fazem quando vão matar ou bater sem temer serem punidos), jogarem gás lacrimogêneo em lugar fechado (tal como jogar no corredor do CRUSP!) ou jogarem esprei de pimenta na olho do mais próximo ou bala de borracha mirando na cabeça ou no peito. Eles querem segurança, sim, aumentando a iluminação, colocando câmeras e aumentando a guarda universitária com concurso e treinamento em direitos humanos e com a inserção de mulheres nela (o que é ainda proibido).

Estão lutando pelo que querem, eles se sentiram incomodados com isso e se manifestaram. Não estão pensando que estão "acima da lei" ou "acima do resto dos estudantes", só estão protestando. E protestando com símbolos maiores que existem em todo o mundo, "a corrupção e a segurança", isso sim.
Olha meus queridos, vocês que falam que "só tem maconheiro na USP", acho melhor sair de casa ou ir estudar então, seja em universidade pública ou privada vocês podem encontram pessoas que fumam maconha e outros - isso tem em todo lugar, até em colégio público e privado, nas festas, nas baladas, nos becos e nas melhores festas. E mesmo quem fuma também não perde o direito de se manifestar, porque tem um bando de hipócritas que já experimentaram e ficam falando ou os que têm a "conduta correta e perfeita" e que continuam no seu conforto de falar e não fazer nada. Além de que QUEM TÁ LÁ foi porque conseguiu passar no vestibular, com regras e condições iguais, rico ou pobre. Então, parem de falar que são um bando de "filinhos de papai que fumam maconha". Tem isso, sim, lá, como tem os que ralam pra se manter e ambos têm os mesmos direitos de se manifestar (afinal, ainda quando jovem você é dependente da sua família e você não escolheu nascer nessa ou na outra).
O que aconteceu na reitoria foi que alguns estudantes fizeram aquilo, para mim, uma parte de radicais e também os que não estão nem ai pra nada (como sempre tem), não importa. "A questão é: os alunos estavam lá e queriam chamar atenção para a causa (ou as causas, ou nenhuma causa)... e, por enquanto, era só. Não havia nada quebrado, depredado ou destruído dentro da tão requisitada reitoria (a única marca deles eram as pichações)"  ( http://www.facebook.com/notes/shayene-metri/desabafo-de-quem-tava-l%C3%A1-reintegra%C3%A7%C3%A3o-de-posse/233831886679892 ), grande parte do que foi mostrado como quebrado destruído, foi por parte dos polícias e da mídia na hora da reintegração de posse. Particularmente, não concordo com os que ficaram lá, mas o movimento como um todo não é baseado nisso, é muito maior - ressurgiu agora com a euforia do momento. E antes a adesão não foi da maioria (a assembléia anterior mostrou isso), agora a maioria está junta, pela causa principal, com a FFLCH e a ECA unidas na greve e em atos e assembléias lotadas.

Se vocês vão falar de patrimônio público, falem isso quando é descoberto um caso de corrupção( são milhões desviados). Do mesmo jeito que você paga imposto, eles também pagam. Só que você tá quieto e eles não. Não tem como uma manifestação ocorrer sem mexer com ninguém, se não, não tem como provocar. Para a Alemanha nazista os que estavam contra ela também deviam ser retratados como “terroristas” ou os judeus como bichos. Para os EUA a Rússia era um monstro (Mas e a bomba de Hiroshima? E os muitos que passam fome na África pra sustentarem as grandes empresas e os mais podres de rico?). Para a Rússia os EUA também era demônio (mas e os que Stálin matou?). Para os ingleses os indianos na Marcha do Sal deviam estar sendo vagabundos que não queriam trabalhar, neh? Para os militares que matavam nos porões, a oposição comia criancinhas e eram os piores ditadores (e a democracia que tanto defendem hoje... Veio dos militares?). Para eles, vários dos artistas que vocês ouvem nos seus foninhos de ouvido, eram “bandidos da ordem”, não é?

Então, tomem muito cuidado quando forem ver as coisas e formar opiniões sobre elas, vai saber bem por que ângulo você está olhando ou recebendo o olhar. Antes disso, não julgue, não seja hipócrita, nem determinista. Hoje, você pode estar pensando assim por estar de fora, de longe, vai saber se um dia não sente na pele? Todos erramos, todos fazemos alguma besteira. A diferença é o que fazemos como algo maior.

Falar que “pagam de revolucionário" ou "que pagam de comunista” é ignorância, numa sociedade que só tem como sobreviver sendo capitalista. Significa que você não pode ter uma ideia diferente? Querer que o mundo seja diferente? Porque se acha que só o pobre pode revidar, então o pobre é o socialista real? E outra, Cuba ou China nunca chegaram nem perto do que o comunismo tem por ideal. No caso da USP, se você não tá lá, não fala que todos são assim ou assado, eles tão lutando por algo justo. Liberdade e democracia real começa por não ter a necessite um polícia para reprimir, nem mídia para manipula, nem políticos que fazem leis só para o próprio benefício. Nem população que ainda é mantida como bestializada, massa de manobra.  Alias, tem alguma coisa que te incomoda nesse mundo? E o que você tá fazendo para mudar? Tem alguma coisa que você queria para o mundo? E você tá colocando nele?
E se estão lutando por uma causa que é muito maior, que chega a toda a sociedade, não venham dizer que tinham que fazer algo realmente e não ”achar que estão fazendo revolução lá dentro” porque que precisamos mudar o mundo pelo que está ao nosso redor, não? Pelo nosso mundo, no micro, no pouco e assim vamos começar a fazer a diferença. Se cada um mudar o que acha errado dentro do seu espaço e dentro de si mesmo, teríamos uma sociedade melhor.

Não sou da USP, nem quero pagar de qualquer coisa escrevendo isso. Só acho que como pessoa, tenho o direito de colocar minha opinião nesses debates que andam surgindo. E claro que não precisam aceitar, alias, eu também tenho a aprender.

Obrigada.

Segue um arquivo aqui que eu fiz com vários textos, fontes, notícias, imagens sobre o assunto, olhem, tem muita coisa interessante. Tente analisar sem preconceito, de cabeça aberta. Não somos donos da verdade, nem mesmo eu. (Caso não abra o link, posso mandar no email).

sábado, 29 de outubro de 2011

Vaivém

“Nunca se distingue bem o vivido do não vivido”

Sophia de Mello Breyner Andresen

CIDADE

Cidade, rumor e vaivém sem paz das ruas,

Ó vida suja, hostil, inutilmente gasta,

Saber que existe o mar e as praias nuas,

Montanhas sem nome e planícies mais vastas

Que o mais vasto desejo,

E eu estou em ti fechada e apenas vejo

Os muros e as paredes, e não vejo

Nem o crescer do mar, nem o mudar das luas.

Saber que tomas em ti a minha vida

E que arrastas pela sombra das paredes

A minha alma que fora prometida

Às ondas brancas e às florestas verdes.

Este é um poema de mais uma poetisa portuguesa, Sophia de Mello Breyner Andresen. Escolhi fazer a análise do poema Cidade por ser um dos meus poemas preferidos da autora. Antes de ater-me à análise em si, é válido esclarecer que a poesia para Sophia tem três sentidos: a Poesia, com P maiúsculo, é uma necessidade, é algo essencial para viver. A autora ainda escreve em seu ensaio Poesia e realidade: que “a Poesia existe em si – independente do homem.” (...) “a Poesia é a própria existência das coisas em si, como realidade inteira, independente daquele que a conhece”. A poesia, com p minúsculo, seria então “a relação do homem com a Poesia”. Por fim, o terceiro sentido da palavra poesia é poema, a linguagem da poesia. “O poeta vê a Poesia, vive a poesia e faz o poema.”

Como pude observar, no poema Cidade encontram-se muitos elementos referentes à natureza. Como mar, praia, montanhas, florestas, entre outros. A partir dessa observação, já se percebe um marco da poesia de Sophia. No prefácio de uma de suas obras já se encontra uma citação da autora: “Nasci (...) entre a cidade e o mar”. Em especifico neste poema, o titulo já diz qual o objeto (o tema) tratado no mesmo: a cidade. Através da observação de Sophia ela descreve o essencial modo de ser das coisas. Segundo Eduardo Prado Coelho, há uma “exaltação afirmativa do real”. Como já atentei mais acima quanto aos elementos da natureza, devo dar atenção em especial para o “mar”, local bastante privilegiado na poesia de Sophia. A poetisaa vê o mar como um modelo de perfeição.

Em contrapartida percebe-se que a cidade é representada no poema como um grande inimigo. Idéia explicitada nos dois primeiros versos: “Cidade, rumor e vaivém sem paz das ruas, / Ó vida suja, hostil, inutilmente gasta”. Coelho diz em Sophia, a lírica e a lógica que a autora tem dois grandes inimigos: a cidade e o tempo. A cidade é representada como um polvo na obra de Andresen. E posso até arriscar o motivo. Imaginando um polvo, a primeira coisa que me vem à cabeça é aquele molusco com oito tentáculos que fazem movimentos incessantemente. Seria então algo que não tem paz, quietude, seria uma coisa em movimento constante, trazendo assim, bagunça, rumor, caos.

Nos versos seguintes: “Saber que existe o mar e as praias nuas,” / “Montanhas sem nome e planícies mais vastas”. Percebe-se um tom de inconformismo, que é confirmado nos versos seguintes: “E eu estou em ti fechada e apenas vejo” / “Os muros e as paredes, e não vejo” / “Nem o crescer do mar, nem o mudar das luas”. Sophia então não se conforma em viver presa à cidade, ao caos, e ser privada de ver o mar, enxergar um horizonte maior e a mudança de fases da lua.

Na última estrofe: “Saber que tomas em ti a minha vida” / “E que arrastas pela sombra das paredes” / “A minha alma que fora prometida” / “Às ondas brancas e às florestas verdes.”, todo o descontentamento com a cidade vem à tona novamente. Nestes versos Sophia diz que a cidade é capaz de “prendê-la”, tornar sua vida obscura. Podemos vê-la até como o exílio. Neste caso, pode-se compreender o exílio no contexto deste poema como uma condição humana imposta aos homens. E até comprometer sua alma, prometida às ondas e às florestas, ou seja, as coisas boas, belas. Aqui se encontra presente mais uma vez o elemento mar (ondas). E percebe-se que todas as vezes em que Sophia se refere a esse elemento há uma positividade, um enorme apreço por este elemento.

Partindo para uma análise estrutural, Rosa Maria Martelo fala sobre a necessidade de Sophia em transitar da palavra para a sílaba em Sophia e o fio de sílabas. Para ela

“Sophia sempre entendeu que a sua poesia não se faria nem com idéias nem com palavras, mas com sílabas, e que o seu conceito de justeza da linguagem poética radica precisamente nessa perspectiva.”

Quanto ao ritmo do poema, percebe-se a predominância do ritmo binário ascendente: um acento fraco (breve) seguido de um acento forte (longo). Nos versos de Cidade as rimas são marcadas de tal forma: a/b/a/b/c/c/c/a/d/e/d/e. Pude notar ainda que as consoantes [s] e [m] são bastante marcadas no poema. Rosa Maria nos chama atenção quanto a isso, na questão da oralidade na poesia de Sophia. Pois, quando criança, Andresen

“pensava que os poemas não eram escritos por ninguém, que existiam em si mesmos, por si mesmos, que eram como que um elemento do natural, que estavam suspensos, imanentes. E que bastaria estar muito quieta, calada e atenta para os ouvir”.

Neste sentido, o leitor é convidado a ouvir e sentir o fluir das palavras enquanto desfruta do poema.

Já que se trata da análise de apenas um poema, muitos aspectos da poesia de Sophia ficaram de fora do texto. No entanto, o esplendor de sua obra ainda pode ser bastante explorado. Que esta humilde análise tenha trazido pelo menos um pouco de Sophia para dentro de cada leitor, e que desperte o interesse de novos espectadores por essa poetisa sui generis. Termino minha análise com alguns versos de um grande amigo de Sophia, o poeta Eugénio de Andrade, os quais dizem: “Sempre que penso nela vejo o mar, muito nítido e azul ao fundo” .